quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Sobre os trinta.


Fazer trinta anos não dói. Está comprovado. Especulam tanto por aí, é tanto falatório em torno desse acontecimento, que, geralmente, fazer vinte e nove instaura mais facilmente uma crise que chegar à terceira dezena de vida. Isso, especialmente, quando os trinta anos são completados por uma mulher. (solteira, diga-se de passagem)

Um dia antes de completar os meus, estava sem sono e fora de casa, pra variar. Não havia com quem interagir. As outras pessoas presentes já tinham passado por este momento e dormiam angelicalmente, ou quase. Como todo insone, procurei algo para fazer e o máximo de ocupação que me deteve foi a organização dos meus objetos pessoais que se amontoavam dentro e fora da mala já fora de casa por uns bons dias.

A tendência era acreditar no terror espalhado ao longo de toda uma vida: a partir de amanhã atravessarás um portal e, sem nenhuma chance de volta, serás atirada no mundo das pessoas de trinta anos. Aquele no qual não há mais chance de voltar atrás. O que se fez está feito, fato consumado. O pensamento virava voz e aproveitando do cenário desordenado, ironicamente, dizia: “_Trinta anos e essa vida forasteira? Quando é que você vai crescer e assumir que não pode mais viver como uma adolescente sem compromissos? É hora de formar uma família, de arrumar um casamento. Você acha que ainda há muito tempo reservado para que você tenha filhos?” Eu, como sempre muito distraída, olhava meu novo corte e cor de cabelo no espelho, sem dar muita importância para aquela voz, até que, finalmente, me dei conta: _ “Por que estou conversando com alguém tão chato?” Eis que, então, surgiu a advogada. Não saí pela tangente:“_ Para o seu governo eu não sou uma adolescente. Aliás, me lembro bem de ter começado a ser gente grande bem cedo, para defender meus trocados. Era um tal de fazer bijuteria pra cá, pirulito de chocolate pra lá; serviço especial de assessoria de avós em assuntos bancários; aulas particulares para adolescentes que não se comportavam como gente grande; portanto, vá alugar outra !” Com gente sem argumento é só aumentar o tom de voz que se ganha a discussão. Pronto. Foi-se embora o pensamento que me incomodava.

Só que, de tanto falar nisso, lembrei de quando fiz quinze anos, data, também, simbólica para as meninas. Na época, e até hoje, os quinze anos de uma garota eram comemorados com uma festa em que se pedia traje social completo ou, com uma viagem à Disney. Os meus foram comemorados nem sei como. Mas, um presente, talvez o melhor deles, não me escapou à memória. Um cartão, daqueles que se envia junto com presentes de casamento, com os seguintes dizeres: “- Kotite, (para quem não sabe, esse é o apelido carinhoso que meu pai me chama desde pequena, extraído do seu mundo fantástico, certamente, eis que não se refere a nada com coisa alguma) meus pára-choques pelos seus quinze anos e, em razão dessa data tão especial, deixo-lhe esse presentaço!” Para a minha surpresa, o presentaço era algo tipo: o que seria hoje uma nota de cinco reais. Pra variar, dei muitas risadas e, amei o presente do meu pai. Para quem o conheceu naquela época, é fácil entender que um momento de espirituosidade daquele valia mais que qualquer viagem pra Disney.

A lembrança veio como um abraço de alguém bem mais interessante que o pensamento atormentador de antes e, me disse coisas igualmente bem mais interessantes e reais sobre a vida e os trinta anos, que simples conceitos padronizados difundidos e pregados aos quatro cantos do mundo como verdades absolutas. Fui dormir. Feliz.

No dia seguinte, acordei, olhei no espelho, fora a cara de amassada, não havia nada de diferente, a não ser as várias manifestações de carinho que recebia, por telefone, pessoalmente, por email, lembrando-me que, agora, eu tinha trinta anos. Pra variar, passei mal antes e depois da minha festa, o que sempre aconteceu nas minhas comemorações, resultado da minha euforia com o aniversário. Isso não era novidade da idade. Voltei pra casa, encontrei meus pais e, qual não foi a minha surpresa quando eles, de presente, me deram um anel, como se eu estivesse fazendo quinze anos! É, definitivamente, fazer trinta anos não dói. O que dói é saber que a vida, pra muita gente, se resume em esperar os acontecimentos padrões para ser feliz. Sou uma mulher de trinta, solteira e feliz.

6 comentários:

Anônimo disse...

Querida bailarina,

Eu integro o time das desprovidas de festa 15 anos "black tie". Aliás, sou da comunidade das que não tiveram baile de formatura, chá de panela, festa de casamento, nem Lua de Mel - sequer em Caldas Novas - e nem tomou canja quando nasceu o primeiro filho. Já tive 30 anos, faz tempo, mas me lembro que foi um tempo excepcional. Portanto, aproveite a nova safra!

Bailarina disse...

Acredito que não deve ter sido muito difícil dispensar o chá de panela e a lua de mel em Caldas Novas! Vai ver que é por isso que seus trinta foram tão felizes! hahaha

O Estupidista disse...

Como vc. poderia ficar triste com seus trinta anos se, hoje, é muito mais gatinha do que quando tinha vinte?

Vc. tem mesmo é que ficar feliz. Muita gente não consegue, mas gostaria de ser independente, bonita, gostosa, leal, inteligente, sensual, espirituosa... Enfim, de ter pelo menos metade dos seus atributos. De modo que vc. tem mesmo é que comemorar a chegada dos trinta. Em vc., eles só representam vantagem.

Bailarina disse...

Uau!Ôpa, valeu o elogio! Não era pra tanto! Beijos

Eleonora disse...

Os meus 30 anos tbém não doeram em mim. Aliás, eles vieram tão despretensiosamente que eu nem sequer me lembro o que fazia no meu último dia na casa dos 20 (só se passaram 8 meses, tá?).

Obrigada, Balzac, que nos livrou do estigma da idade e que fez dos 30 anos uma fase bem interessante (pelo menos, eu estou achando).

Concordo com o estupidista. Você tem mais é que ficar muito feliz com os seus trintinha. Sinceramente, acho que estamos bem melhores do que quando tínhamos 20. E eu te conheci quando tinha 20, lembro bem da sua voz. Garanto a você que seus cabelos estão muito diferentes (e bem melhores).

Ah, também integro o time das que não tiveram festa de 15 anos nem viagem a Disney. Mas, em compensação, tive chá-de-panela e baile de formatura.. (tem perdão?)E, graças a Deus, não tomei canja quando meu primeiro filho nasceu.

Bailarina disse...

Sim, naquela época acho que eles eram laranja. Não havia como ter um cabelo bonito nessa cor, hãn? Quanto ao chá-de-panela, vou te perdoar porque qdo me mudar vou fazer um chá-de-casa nova, de troco. hahaha Qto ao baile, bom, baile eu tbem tive, não posso reclamar e me lembro que foi um dia de grandes emoções, não só pela formatura. Quem estava lá deve se lembrar da minha alegria! Ah, foi no meu baile, tbem, que a Cris e o Rafa se conheceram, ou seja, o Bibi é consequencia de um baile de formatura!

Em tempo: Balzac só constatou o óbvio, graças a Deus.