
Amanhã é aniversário da minha mãe. Ela completará 60 anos, o dobro da minha idade. Três décadas nos separam e ainda assim somos tão parecidas. Vejo-a aqui, às voltas com seus apetrechos, organizando sozinha a festinha pra receber seus amigos, exatamente como eu costumo fazer. É tanto cuidado que parece até que é a primeira vez que recebe alguém em casa. Não pediu ajuda, mas ficou olhando de canto de olho, cara de cachorro sem dono, à espera de um oferecimento espontâneo, afinal de contas ela está fazendo 60 anos, não é possível que seus filhos sejam tão ingratos a ponto de ignorar solenemente a importância de ajudar numa hora dessas. Sim, é possível. Ignoramos todos. Faz parte da estratégia repetida. E ela mais uma vez caiu.
A estratégia é fingir não se incomodar com a proximidade da data, como se ela fosse passar como mais um dia comum, para que cada uma das pequenas surpresas que preparamos para o dia tenha mais intensidade ao ser revelada.
Uma delas eu acabo de concluir. Esse ano, de presente, ela me pediu um sonzinho, desses portáteis, para que possa ouvir seus discos onde queira. Admirei. A música sempre foi predileção do meu pai. Minha mãe adora filmes e, especialmente os que já estão pela metade. Não importa o que seja. Até mesmo aqueles filmes japoneses que ninguém, mas ninguém mesmo tem qualquer paciência para assistir. Por isso, nunca teve um som só dela, assim como tenho eu, ou meu pai, que ouvimos música quase o tempo todo enquanto estamos em casa, o que nos faz monopolizar nossos aparelhos. Como adicta que sou, não haveria presente mais prazeroso para lhe dar. Amanhã ela acordará ouvindo um disco novo, em seu primeiro som. Aos sessenta. Nunca é tarde.
Para incrementar o presente, pedi que meu pai e cada um dos meus irmãos, escolhessem músicas que gostariam de dedicar a ela, que eu as gravaria num CD personalizado. Acabei nesse exato momento de fazer a compilação. Ri. Embora sejamos até criativos, sem qualquer falsa modéstia, fomos totalmente previsíveis e lugar comum. Meu pai mandou-lhe um batidíssimo The Platters, com seu “Only You”, e a lista prossegue com várias outras canções clichês, tipo: amor igual ao teu; se todos fossem iguais a você; bola de meia, bola de gude... Faltou só a Canção da América, mas, graças a Deus, estamos comemorando aniversário e não despedida e ninguém teve a falta de senso de incluí-la.
O fato é que me dei conta que quando se trata de expressar o amor por alguém é simples assim, não há nada melhor mesmo do que ser descarado, piegas, fru-fru e repetitivo. E é assim que agimos quando nos vemos desarmados diante desse amor. Principalmente o amor correspondido dos pais e seus filhos e dos casais que se agüentam por tanto tempo. Nunca vai ser demais dizer que se é seu fã n.° 1, mesmo porque, não se sabe até quando se terá a oportunidade de dizer tudo isso de novo. E é muito triste não poder dizer. Pode ser tarde.
Só de pensar na idéia, já me vejo tentada a desistir da estratégia, sair correndo, dar lhe um monte de beijos na bochecha e dizer que não se entristeça, que espere só mais um pouquinho e, logo verá que ao contrário do que pensa, não esquecemos nem um pouco dos seus 60. A ansiedade vem, mas, não posso estragar a surpresa! Já sou sempre acusada de intempestiva. Como boa impulsiva que sou, adotei mais uma estratégia: entreguei o presente de dia das crianças ao Gabriel! Ufa! Aliviei-me com suas risadinhas de alegria ao ver seu personagem preferido nas mãos. Também quero chegar aos 60.
3 comentários:
E essa homenagem, ela já leu? Merece, viu? Adorei de novo...Té manhã!
Eu também quero chegar aos 60. E, de preferência, com marido e filhos assim, tão queridos e dispostos a me prestar uma homenagem dessas. Simples assim, adorável assim.
Tenho a impressão que chegarás...rs Afinal de contas, foram muitas horas pintando aqueles barquinhos...
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